Quinta-feira,
final de fevereiro de 2008, uma inesperada chuva ainda caía pela madrugada de
Fortaleza. Havia ido pegar meu filho que fora assistir a um show no Centro
Dragão do Mar, na Praia de Iracema. Decidi ir pelo Centro velho da cidade,
precisamente pela Praça do Ferreira, evocando pessoas e lugares que marcaram a
história do Ceará.
Dirigia
de maneira lenta e, de repente, a cena que vi me deixou chocado: uma mulher
magra e maltrapilha dormia sobre papelões e fazia de seu próprio corpo agasalho
para cobrir os dois filhos, os quais talvez tivessem entre cinco a oito anos de
idade. Na calçada da loja vizinha, um homem de camisa suja e rasgada também
dormia próximo à sua carroça de catador de lixo.
Sem
me dar conta, parei e pude perceber melhor aquela triste situação, com certeza
bastante comum pelas ruas da "Loira desposada do sol". Mas não me
contive e chorei. Por uma estranha lógica que revolve a lembrança, pensei na
velha negra e desempregada Espírito Santo, de Senador Pompeu (291 km de
Fortaleza) que, na década de 60, acolhia as pessoas doentes e loucas que viviam
pela rua, levando-as para suas próprias casas. Em seguida, não pude evitar que
meu pensamento fosse inundado por grandes figuras idealistas e solidárias da
história da humanidade. Logo me veio à mente Francisco de Assis, o santo, com
sua humildade e seu carinho para com os pobres.
Até
parece que estava vendo Madre Teresa de Calcutá a prestar solidariedade àquela
família ali, debaixo da marquise, em plena chuva. Daí para chegar a Karl Marx,
que concebeu uma sociedade sem explorados ou exploradores, foi um pulo.
Devo
ainda dizer que primeiro me veio o pensamento escapista de que aquele casal
saiu para trabalhar e apenas não havia encontrado com quem deixar seus filhos.
Digo
mais: senti-me acovardado e egoísta diante daquela família empurrada para a
sarjeta e marcada pela miséria. Só não pude esquecer o olhar da mulher que, ao
acordar, pareceu-me ter mirado o vazio no infinito.
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